Garantir sustentabilidade na cadeia de valor é mais do que exigência regulatória
21/05/2025 13:00
A integração dos critérios ESG (ambientais, sociais e de governança) nas cadeias de valor das empresas já não é apenas uma tendência ou boa prática: é uma exigência regulatória com impacto direto no negócio. Diretivas europeias, como a CSDDD e a CSRD, obrigam as organizações a prestar contas sobre o impacto que os seus fornecedores e parceiros têm no ambiente e nos direitos humanos. “Cumprir o mínimo já não é suficiente, é preciso transformar a forma como as empresas se relacionam com os seus fornecedores e parceiros”, alerta Pedro Q. Cruz, ESG Coordinator Partner da KPMG Portugal.
A Diretiva de Due Diligence em Sustentabilidade (CSDDD), aprovada pelo Parlamento Europeu, obriga empresas com mais de 500 trabalhadores e faturação superior a 150 milhões de euros (ou 40 milhões para setores como têxtil e mineração) a identificar, prevenir e mitigar impactos negativos ao longo da sua cadeia de valor. Já a Diretiva de Reporte de Sustentabilidade (CSRD) exige que mais de 50 mil empresas europeias publiquem relatórios detalhados sobre o seu desempenho ESG até 2028, com base em normas comuns (ESRS). As multas por incumprimento podem chegar a 5% da faturação anual global.
Contudo, o quadro regulatório está a evoluir e, em fevereiro, a Comissão apresentou novas propostas de simplificação da aplicação das normas, com o objetivo de reduzir o peso administrativo e tornar o sistema mais proporcional, sobretudo para as PME. Entre as principais alterações está o adiamento por dois anos da entrada em vigor das normas setoriais ESRS. Foi também proposto um modelo de reporte voluntário simplificado para PME não cotadas, com menos exigências e indicadores mais acessíveis.
“Estamos a ouvir as preocupações das empresas e a adaptar o ritmo de aplicação da regulação para garantir que a transição verde é exequível, sem abdicar da sua ambição”, apontou, em fevereiro, Mairead McGuinness, comissária europeia responsável por esta área. As propostas estão ainda em discussão.
“A crescente necessidade de descarbonizar a produção está a pôr uma grande pressão sobre os fornecedores de peças e matérias-primas”, aponta Pedro Q. Cruz, referindo-se a setores como o automóvel ou o retalho. O mesmo acontece com a rastreabilidade dos produtos e a eliminação de práticas laborais abusivas. Ainda assim, muitos desafios persistem, nomeadamente a “visibilidade reduzida sobre fornecedores indiretos” ou a “ausência de dados fiáveis na cadeia de valor”.
A importância desta transformação é confirmada pelos números: estima-se que cerca de 67% das emissões de carbono das empresas tenham origem na sua cadeia de fornecimento (emissões Scope 3), segundo o Carbon Disclosure Project. No entanto, apenas 28% das empresas europeias fazem auditorias regulares aos seus fornecedores com foco em critérios ESG, de acordo com um estudo da McKinsey & Company. Por outro lado, 60% das empresas reconhecem ter dificuldade em obter dados ESG fiáveis dos seus parceiros.
Para o especialista da KPMG Portugal, a diferença entre as organizações que lideram esta transição e as que ficam para trás está no grau de ambição. “As empresas que integram fatores ESG nas suas decisões estratégicas e definem metas para os seus fornecedores estão a criar valor e vantagem competitiva. Já aquelas que se limitam a cumprir o regulamento adotam uma postura reativa, sem impactos reais”, afirma.
A integração estratégica destes critérios já não é, porém, apenas um imperativo regulatório, mas também uma necessidade financeira. Rodrigo Tavares, professor convidado na NOVA SBE, defende que a sustentabilidade deve ser tratada como uma componente crítica de engenharia financeira. “A não integração desses fatores compromete a robustez dos fluxos de caixa projetados, distorce métricas de retorno ajustado ao risco e pode levar a decisões subótimas de alocação de capital”, considera.
Rodrigo Tavares afirma que, hoje, a sustentabilidade está no centro da avaliação de risco, do custo de capital e da estrutura de capital das empresas. “A materialidade financeira dos riscos ESG — como emissões, passivos ambientais ou práticas laborais irregulares — exige que estes dados sejam incorporados em modelos clássicos de corporate finance”, sublinha.
Também Manuel Carlos Nogueira, professor da Universidade de Aveiro, acredita que a transparência pode ser um trunfo competitivo. “Se as empresas conseguirem passar a mensagem para o cliente e para o investidor, mostrando que o que relatam corresponde à verdade, isso pode ser uma oportunidade para progredirem na cadeia de valor e cobrarem um valor percecionado mais elevado”, refere. O docente considera ainda que esta mudança representa um “processo sem retorno”, mesmo para as pequenas e médias empresas (PME). “Pode ser que hoje ainda não seja obrigatório para uma PME, mas daqui a dois ou três anos será com certeza”, perspetiva.
As empresas que se prepararem desde já terão uma vantagem competitiva quando a regulação se aplicar a todos, consideram os peritos ouvidos pelo Negócios. E essa preparação começa pela definição de métricas claras e comparáveis, que permitam às organizações avaliar o seu desempenho e comunicá-lo eficazmente aos stakeholders. “Isto é como os balanços financeiros: temos de saber onde estamos a cumprir, onde estamos a falhar e como evoluir”, explica Manuel Carlos Nogueira.
A tecnologia é outro aliado nesta transição, com ferramentas de rastreabilidade, blockchain e inteligência artificial que permitem mapear a origem de matérias-primas, prever riscos e monitorizar em tempo real o desempenho ambiental e social dos fornecedores. “A tecnologia está a tornar possível o que antes era inviável”, confirma Pedro Q. Cruz, que avisa que “estas ferramentas só criam valor quando integradas numa estratégia clara e com verdadeiro compromisso com a sustentabilidade”.
Num contexto global instável — com tensões comerciais, guerras e mudanças geopolíticas — há quem questione se a agenda da sustentabilidade pode perder força. Manuel Carlos Nogueira admite que alguns atrasos são possíveis, mas recusa a ideia de retrocesso. “É evidente que se a União Europeia seguir os Estados Unidos num recuo face ao Acordo de Paris, poderá haver uma paragem, mas retrocesso não creio. Isto é um caminho sem retorno”, sublinha.
Para os consumidores, também não há dúvidas: 82% dos europeus preferem comprar produtos de empresas com claro compromisso ambiental e social, segundo o Eurobarómetro. Além disso, 63% deixariam de comprar de uma marca se descobrissem práticas abusivas na sua cadeia de fornecimento, revela um relatório da Capgemini.
A cadeia de valor parece ser hoje o novo campo de batalha da sustentabilidade empresarial, que desafia os empresários a rever as suas relações com fornecedores e parceiros, enquanto garantem a viabilidade financeira desta jornada. “Aqueles que veem os critérios ESG como um fardo regulatório não perceberam a direção do mercado. A médio prazo, só sobreviverão as empresas que integrem estes valores na sua cultura organizacional”, remata Rodrigo Tavares.
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